Há algum tempo, escrevi um texto chamado "Erros" que dizia o seguinte:
É triste como nós acabamos por pagar pelos erros dos outros – pessoas que nós sequer chegamos a conhecer -, ao longo dos anos. A vida foi se transformando de tal maneira que o acúmulo de questões não resolvidas, uma após a outra, criou um campo magnético de histórias que vão, colidem e retornam, para se repetir e repetir e repetir até que haja um fim.E hoje me encontro degustando o amargo da verdade sob minhas próprias palavras. Me vejo criança novamente - aquela garotinha de lisos cabelos escuros que lhe caíam ao meio das costas -, imitando exatamente o que seus pais faziam, da melhor maneira possível para uma criança de 3, 4 anos. Se eu soubesse...
Ninguém tem como, eventualmente, prever como as coisas se desdobrarão no futuro - o que fazemos é uma estimativa - que nada de aproximada tem - tomando como base o que já vivemos e o que estamos vivendo, no presente. Mas a vida não segue um padrão. A vida tem curvas fechadas e a vida tem declives íngremes demais para que a descida seja suficientemente segura. Quando dizem que esta é uma via de mão dupla, é exatamente isso que se quer dizer: o que pra uns é um declive, pra outros, é um aclive - dependendo do sentido de onde se está vindo. Eu estive no aclive, uma subida longa e meio cansativa mas que, no fim das contas, sempre pareceu valer à pena - algo que eu esperava durar por muito, e muito, muito tempo. E agora, do outro lado, no meio de uma descida longa e veloz demais para que eu possa formar pensamentos claros, contra o vento, sinto a força de todas as coisas que eu dei por garantidas batendo contra meu rosto - abrindo feridas que, quando e se vierem a fechar, deixarão marcas que eu não sei quanto tempo vão demorar para sumir.
Dói notar que tudo o que sou por predefinição é parte de uma marca já deixada em outras pessoas. E dói ver que, tudo o que eu quiser ser, sempre, vai depender da herança emocional que me foi deixada. As pessoas mal sabem... seus descendentes carregam consigo tantas coisas inatas, que provêm justamente de seus progenitores, que, pra eles, não há opção de escolha. Nunca, até que decidam se libertar disso.
Me entristece tanto perceber os costumes que tanto me incomodam em minha própria personalidade, e o quanto me esforço - até então, sem sucesso - para modificá-los, e saber que os mesmos só existem, hoje, pela maneira que fui feita acreditar ser o certo quando meus longos cabelos castanho-escuros ainda eram lisos demais. Talvez servisse de conforto saber que grande parte da minha frieza não é nada que eu defenda ou pela qual tenha optado, se não me magoasse tanto o fato da mesma ser algo com que convivo todos os dias. "Sou poeta e não aprendi a amar"? Não. Eu sou "poeta"¹, sim. E, se tem algo que eu aprendi muito bem, foi a amar. O que, de jeito nenhum, quer dizer que eu tenha aprendido a demonstrar isso; eu amo, e amo com fervor, com tudo o que há e que já houve em mim - uma tentativa desesperada e inerte de sair de um poço onde fui atirada antes que me ensinassem a nadar. A vida.
Por conta disso, sou constantemente levada a repensar e analisar e fazer tudo o que posso, sempre, para ter certeza de que amo do jeito certo. Afinal, se me deixaram herança, esqueceram de deixar definição... Seria isso algum tipo de liberdade? Porque, para mim, parece mais uma prisão.
Isso me leva a reconsiderar se algumas de minhas atitudes foram tomadas porque eu queria proceder de tal forma ou se porque achei que era a melhor solução, puramente baseada no que algumas outras pessoas fariam. Mas eu não tenho como saber a resposta para essa dúvida.
O que eu tenho como saber, no entanto, é que o impulso de escrever, em busca de alguma solução, não é uma herança emocional, mas sim, genética.
E que eu estou, finalmente, me libertando.
¹A expressão correta seria "poetisa", no feminino.
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Sei que é chato isso, mas já que você não é um robô e - creio eu - tem sua opinião, não custa digitar umas palavrinhas, né? Agradecida :)